terça-feira, 2 de julho de 2013

As vezes temos que parar.

« Os homens sao adaptaveis, estou no Don com Ondas de mais de 10 metros, tranquila, lendo um livro » envio esse msn ao meu pai.

O Don esta limpo, apesar de bastante umido.  A umidade do ar passa dos 94%.   Levanto e vou ver como esta a bateria. Muito baixa.  Os paineis solares nao estao dando conta pois nao faz sol ha quase um mes. Ligo o motor, para carregar as baterias, preocupada, pois nao posso aumentar a velocidade do barco que por vezes surfa uma onda e passa dos 18 nos.  Coloco um espaguete para cozinhar e chamo Ellen.  Ela estava deitada e levanta com o meu chamado.  A comida dela fica sobre a pia na cozinha.
Sento na mesa de navegaçao e vejo o painel eletrico.  Desligo o que nao é necessario estar ligado.  Quando desligo a luz do barco, que fica acima do botao do piloto eletrico escorrega meu dedo e sem querer desligo o piloto.  Nao deu nem tempo de pensar, o barco atravessou e capotou.  Mais de 180 graus.  Fui lançada de qualquer jeito e Ellen coitada.  Nem vi o que passou com ela.  Assustada vou olhar pela porta do barco que saiu.  Estou toda molhada.  O frio é muito grande, mas nessa hora nao consigo pensar nisso.  O barco ficou uma bagunça e ainda esta deitado 90 graus.  Olho os paineis soltos, o barulho do motor e penso assustada.  « Nao volta pro lugar ? ».  Estava tudo perfeito e um vacilo coloca tudo a perder.  O barco volta depois de uns segundo, ou minutos, nao sei, so sei que foi uma eternidade.

Vou la fora e vejo que a cruzeta esta quebrada e os estaiamentos estao folgados. Corto o cabo que segura a vela grande e solto o amantilho e a retranca cai.  Pego as 3 adriças e o amantinho  para segurar o mastro.  O Don navega agora sem piloto e no contra vento.  Algumas ondas lavam o barco e outras batem com violencia.  Os Paineis estao presos agora  so com o cabo eletrico e o vento grita e bate com violencia sobre eles.  Entro e os observos angustiada.  Saio novamente e tiro eles do lugar onde estao, corto os cabos que os seguram.  Coloco eles sobre a banco do cockpit.  Entro rapido.  Ligo a bomba de porao e tiro a agua que entrou.  Minha cama e minhas cobertas molharam todas.  Tem macarao por todos os lados.  Os galoes de agua quebraram e fico com menos de 8l de agua mineral.


Procuro Ellen e ela esta escondida e nao quer sair debaixo da cama.  Tadinha.
Que triste. Nao posso acreditar.  Passo 2 dias ate consegui arrumar assim, assim o Don. Os eletronicos param de funcionar, o painel eletrico precisa de reparo.  Aviso Marcos Lobo e Alain. Mas nao meu pai. Preciso sair dessa situaçao que eu me coloquei.  Depois de uns dias pensando  como arrumar a cruzeta Alain e Bernard da Delta Voiles me passa uma otima soluçao, mas preciso subir no mastro. A ideia era fazer uma peça em madeira amarrar na cruzeta devagar e desentortando ate ficar no lugar.  Mas as condiços do mar e vento nao ajudam.  Passo um dia para preparar a peça, pois preciso serrar a madeira, que tirei de uma cama. E faço um dos lado convexo da peça para encaixar no mastro.
Com o mar de 5m e ventos entre 15 e 20 nos passo o dia tentando subir no mastro, nao consigo.  Esta chovendo .  Entao com ajuda de duas adriças e dos cabos presos por baixo, um na popa e outro proa, consigo encaixar a peça embaixo da cruzeta danificada, mas nao consigo colocar ela no lugar, mas consigo apertar os estais.
Volto a velejar, mas com pouco pano.  No dia seguinte a chuva para e o vento fica em tornos dos 15nos, o mar estar entre 4 e 5 m.  Subo no mastro.  Horrivel subir no mastro nessas condicoes, pois nao posso colocar a vela grande e tenho que folgar os estais.  Para me sentir mais segura eu coloco o pau de spi 45 graus em relaçao ao mastro, presos por uma adriça e dois cabos em baixo um na popa e outro proa.
Passo um cinto de segurança em volta do mastro e preso em mim e subo.  Mesmo assim sou lançada de um lado para o outro.  Procuro me concentrar e consigo um pouco tremula prender um cabo de dynemma em volta da cruzeta e da peça de madeira, e mais braçadeiras.  Desço, puxo a adriça e a cruzeta volta ao lugar.   Prendo novamente os estais.


Que alivio pode voltar a navegar rumo ao Cabo Horn.  As condicoes dentro do Don ficaram precarias.  Agora sem agua preciso usar mais o dessanilizador, que representa gastar disiel para carregar baterias.  So tenho 40 l  de disiel gasto 2l por hora.
Em uma hora dar para fazer 5l de agua normalmente. Minhas roupas estao molhadas e tenho muito frio.  Coloco a tps, uma roupa de neuprene, mais nao aquece.  A pele dos meus pes ha dias ja estavam necrosando e fico preocupada.  O frio é insuportaval.
Passo a usar o leme de vento direto para economisar energia.  Com ondas muito grande ele nao funciona bem.  O mar volta a ficar grosso mais de 8m e depois de uns dias o Don volta  a deitar.  Minha viagem ja se tornara um estorvo.  Dormia de Tps numa cama molhada  e com cobertas molhadas.  Bebia agua salobra e o frio estava me matando.  Perdi muitos dias para reparar a cruzeta e o leme de vento que se quebra nessa ultima atravessada do Don.  Estou exausta  e dou um basta. A viagem era pra ser um prazer nao um estorvo. Vou atras do Calor e rumo para o norte.  A decisao nao foi facil, mas ja estava tarde para passar no Cabo, as condiçoes climaticas cada vez piores, mas o que mas contou para eu desistir foi o frio.  Insuportavel .  Dormir de TPS com tudo  molhado.  Muita coisa se estragou de comer, pois uma caixa se quebrou. Nao tenho mais misturas e como feijao com farinha e ate miojo cru com cafe.  E aindo acho uma delicia.  Ellen passa a ficar esfomiada.  Tem bastante  comida pra ela.  Mas acho que ela sente o que estou sentindo. Faço panqueca com mel, bolinho de fuba e ela devora.  Inacreditavel ela que so comia raçao e rejeitava ate carne.
Mas desistir do cabo nao representava chegar logo em terra.  O lugar mais perto era Ilha de Pascoa.  Os ventos nao ajudavam.  Muita calmaria e vento contra.  Muitos pirajas que faziam que fizesse bordos constante, cansativo.
Avisto Ilha de Pascoa mas levo mais de 48h para chegar.  Com a ajuda da Capitania e de Macos Lobo que veio para Pascoa para fazer toda logistica da minha chegada, amarro os cabos do Don.  A entrada no porto é dificil. Levo o leme concentrada e consigo entrar em segurança. Ufa!  Eu tinha chegado as 3 da manha na ponta sudoeste a 3milhas do porto, larguei um balde na agua preso num cabo e fui dormir.  Apesar do vento e corrente, desloquei so 0.2 milhas. Quando amanheceu me aproximei do porto com um pouco de pano e motor.
Obrigada a Capitania da Ilha, eles foram gentis e prestativos, ao Porto que ajudou em tudo e ainda subiu meu barco por segurança, ao Marco Lobos e a Zelia que me abraçaram e que me fizeram sentir segura. Eles foram mais que amigos.  Obrigados a todos, a familia francesa do veleiro que esta no Porto, ao pequeno Enzo, ao Andy, ao Jorge Pont responsavel pelo porto.  Ao simpatico capitao Eduardo Ortiz Dias que procurou que tudo ficasse bem.  A Jaqueline e a todos da capitania.  Super prestativos.  E a todos que mesmo nao estando na Ilha me acompanharam e torceram para tudo dar certo.  Aqui ja fiz amigos Como a familia de Mike e Maricel e do pequeno Kevin que estao me dando carinho atençao e um catinho para mim e Ellen em terra.  Ao Edson que com sua energia, atencao  e que me arrumou uma bike e esta sempre verificando se esta tudo bem. 
A Ilha de Pascoa é linda.  Tem voos diarios e vale a pena ser descoberta.  Por mar é dificil confesso. 
Que os bos ventos me levem para casa.   Que o mar seja sempre a nossa estrada Bel.